sábado, 16 de novembro de 2013

Nutricionista ou educador? Ou nutricionista E educador?

Já ouvi muito coisas como:
"O nutricionista clínico tem que ter um senso de motivação forte"
"O nutricionista é como um educador. Ele deve se empoderar da capacidade que tem para transmitir seu conhecimento de forma eficaz ao paciente;"

Quando eu penso que, não podendo mandar fazer exercícios, não podendo também prescrever medicações que facilitem o emagrecimento, concluo que a principal cartada que o nutricionista se utiliza com seu paciente numa clínica é a reeducação alimentar, então, de fato, o nutricionista precisa ter em algum momento de sua formação uma capacitação para que ele possa exercer tal qualidade, que, vejo, é indispensável. 



Afinal, a tarefa de introduzir novos hábitos alimentares na vida de uma pessoa não é fácil, por mais motivada que ela esteja. Educar vai muito além de jogar uma tabelinha no colo da pessoa com uma contagem calórica x que foi estimada em seu metabolismo basal. Honestamente, se o trabalho do nutricionista fosse resumido a isso, eu que sou só 1/5 nutricionista já poderia sair atuando.

Até o momento, a matéria que mais abordou esta demanda do nutricionista é a Promoção da Saúde, a qual com seus princípios e campos de atuação, visando a criação de condições favoráveis a saúde enquanto critica a visão e atuação medicalizada sobre os problemas de saúde. 

O sociólogo Edgar Morin apontou que, para que possamos lidar com os problemas de complexidade crescente que nos circundam, temos que nos ater a uma cultura igualmente complexa que nos capacite a pensar em soluções com diversas dimensões, e é exatamente o que percebe-se quando pensa-se nas condições de saúde da população brasileira. 

Os níveis de obesidade crescem junto com o poder aquisitivo, mesmo que na contramão também surjam cada vez mais iniciativas que visam o estabelecimento de hábitos saudáveis. Por que então ainda existe esta dualidade? O que está faltando para que se lide eficazmente com isso? Em um dos seminários que realizei neste semestre, falei sobre a forma como o enfoque da Segurança Alimentar e Nutricional é capaz de resgatar as multidimensões do alimento e fortalecer a Promoção da Saúde na elaboração de políticas públicas.

Ainda no começo do semestre, estudamos sobre as diferentes vertentes da pedagogia e delas, a que melhor se adequa ao trabalho do profissional da saúde é a chamada Pedagogia da Problematização.
Tal como nas escolas, é fundamental para o profissional da saúde levar em conta a realidade de seu paciente, conhecendo-a e partindo dessa compreensão crítica para elaborar medidas que tragam para a pessoa a consciência e a capacidade de mudar sua realidade.


A pressão social (e virtual) do dia-a-dia:
"Você quer ossos dos quadris ou pizza? Um espaço entre suas coxas ou bolo?
Clavículas ou doces? Uma barriga chapada ou refrigerante?:
NÃO DESISTA DA PERFEIÇÃO"
Afinal de contas, nunca é só de quilos a mais/menos que as pessoas realmente buscam nos consultórios; embora não tenham consciência plena disso, elas demandam por um tratamento que mude seu pensamento sobre sua alimentação e sobre sua realidade, que as faça compreender da rotina dúbia que a mídia e os costumes lhes impõe: Aprenda a ser magro num ambiente obesogênico.


Que elas possam aprender e assimilar em parte por conta própria novos hábitos alimentares sem seguir roboticamente roteiros alimentares que nem sempre lhes fazem sentido. Que não precisem a vida toda de um nutricionista para lhes tratar e que a busca por uma promoção pessoal da saúde se torne um hábito. Considero o enfoque da promoção da saúde tão fundamental que faz muito sentido pra mim que a disciplina seja dada no primeiro ano, como "matéria básica". Não cabe ao nutricionista ficar correndo atrás de somente tratar doenças; a visão medicalizada não deve se aplicar mais nesta área. 

Nascemos e morremos com uma mentalidade muito hipocondríaca, e não precisamos passar a vida toda à base de remédios, "tratando a consequência e não a causa", para termos ideia da insustentabilidade desta visão.

Se na formação o nutricionista pode aprender isso, ele também pode muito bem transmitir àqueles que trata.


REFERÊNCIAS
CORTELLA, Mário Sérgio. Educação como instrumento de mudança social. IN: VARGAS, HC; RIBEIRO, H. Novos instrumentos de gestão ambiental. São Paulo: EDUSP; 2001. p 43-54


COSTA, Christiane Araújo; BOGUS, Cláudia Maria. Significados e apropriações da noção de segurança alimentar e nutricional pelo segmento da sociedade civil do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Saude soc.,  São Paulo ,  v. 21, n. 1, Mar.  2012 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-12902012000100011&lng=en&nrm=iso>. access on  16  Nov.  2013.  http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012000100011.

MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2003.

PEREIRA, Adriana Lenho de Figueiredo. As tendências pedagógicas e a prática educativa nas ciências da saúde. Cad. Saúde Pública,  Rio de Janeiro ,  v. 19, n. 5, Oct.  2003 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2003000500031&lng=en&nrm=iso>. access on  16  Nov.  2013.  http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2003000500031.